segunda-feira, 2 de maio de 2011

Bioética e a dignidade da vida



O discernimento moral é particularmente significativo e iluminador em situações concretas em que uma pessoa ou grupo tem séria dúvida ou perplexidade a respeito da opção moralmente correta a tomar. É ai que o discernimento criterioso e prudente torna-se absolutamente indispensável.

De acordo com a visão da santidade da vida, muito influenciadora da cultura ocidental, qualquer interferência no processo reprodutivo é proibida e imoral. Argumento que tais posições são inconsistentes e que as pessoas têm o direito de decidir. Estamos presos a antigos tabus e lógicas que devem ser descartados.

Uma pessoa é, primeiramente, um indivíduo que se distingue dos demais seres naturais por uma possibilidade inédita, a racionalidade. Pessoa é, então, o indivíduo racional. Não vejo no avanço da genética um risco de dominação do homem pelo homem, violando sua autonomia; pelo contrário, pode dar ao homem melhores condições de utilizar esse conhecimento, respeitando a individualidade.

Somente se conseguirmos programar nosso organismo biológico poderemos resistir ao desaparecimento. Por isso, é justo intervir, não devemos ter medo. Espero que os homens façam melhor, ou mais bem feito que Deus. Porque não acredito que Deus tenha feito somente coisas boas. Existe tanto sofrimento no mundo, tantas pessoas que nascem com doenças terríveis!

A Bioética trata desde a concepção humana, clonagem, pesquisas com as células-tronco até as questões sobre a morte (assunto que está sendo debatido mais do que nunca). Quando se deve prolongar a vida, mesmo sem nenhuma esperança de cura e aumentando a dor do paciente? Há tanto estudo e debate que se exige um pouco de nossa atenção e conhecimento. Estamos vivendo o século da biotecnologia.

Sem Ética, portanto, o ser humano corre o perigo de ser apenas mais um animal. Nenhuma civilização pode funcionar sem leis. A Bioética quer ser a luz que guie as nossas decisões nas áreas que tocam a qualidade da vida. É um exame crítico das dimensões morais ao tomar decisões sobre assuntos relacionados com os cuidados da saúde, e em contextos envolvendo as ciências biológicas (tecnológicas). Há uma grande sensibilidade hoje em relação à vida e à saúde humana. Mais e mais nós acabamos nos inconformando com situações em que onde deveria existir saúde, existe doença e onde existe morte, deveria existir vida.

Então, no fundo, a bioética clama por dignidade humana, por respeito à pessoa humana, o ser humano. Eu definiria a bioética como um grito, um brado forte pela dignidade humana e por mais qualidade de vida, desde o nível individual, pessoal ou até ao nível social, coletivo em todos os âmbitos da vida. Este é o grande movimento de ser uma área do conhecimento humano que frente ao extraordinário progresso, em curso, nas ciências da vida e da saúde transforma todas estas conquistas em possibilidades de uma vida mais saudável, mais digna e mais feliz.

Assim como, por exemplo, a encíclica Evangelho da Vida saúda o nascimento da Bioética como sendo um sinal de esperança na contemporaneidade que vem nos convidar a envidar esforços para que a humanidade dialogue, reflita e cheque a algum consenso mínimo em relação a algumas questões cruciais relacionadas à vida humana, desde antes do nascer até o morrer.

Desde que o ser humano é ser humano existe a bioética, só que ela vai atualizando, ela vai contemporizando, ela vai nos desafiando, vai tomando as formas e os desafios do tempo atual, vai se formatando na nossa cultura. Claro, esta é uma observação muito sábia, no sentido de dizer que o que é novo, pois temos tantos modismos. Na verdade, o que é novo são essas situações novas que a tecnociência, a ciência está trazendo e que vem interferindo decisivamente na vida do ser humano.

Mas desde que o ser humano é ser humano se pergunta sobre o sentido da sua existência, a forma como se relacionar com o seu semelhante e como interferir na natureza humana. Nós temos aí, eu diria assim, uma questão ética. Claro, que com o advento da ciência, a partir especificamente do século 15 e 16, do pensamento científico, que acabou ficando um pouco na penumbra e que hoje vem sendo colocado novamente em evidência, tendo uma visibilidade muito importante, porque a vida no planeta terra está em jogo, como intuiu muito bem Rensselaer Van Potter, esse oncologista norte-americano que no ínicio da década de 70, mais precisamente em 1970-1971, escreveu o primeiro livro de bioética: Bioética, a ponte para o futuro.

Aí ele chamou a bioética de ciência da sobrevivência. Ele pensou a vida, eu diria assim, essa ciência de nos garantir o futuro, onde precisamos nós, cientistas e humanistas, conversarmos sobre essas questões. Não podemos ficar isolados, pois a vida é algo muito importante para ser deixada somente nas mãos dos cientistas. Nós todos temos interesses e temos valores em jogo e precisamos cuidar disso. A maior efervescência em termos de progresso científico no campo das ciências da vida é a chamada Era Genômica. Nós estamos em plena Era Genômica.


Dom Eduardo Rocha Quintella
Bispo Diocese Belo Horizonte

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